O rádio exerce fascínio e segue firme, sendo companhia em som. Mexe com um sentido, o da audição, e daí, transforma emoção, alegria, indignação e até gritos de euforia. E o aparelho da voz, e o veículo da rapidez e principalmente, da proximidade. Da comunidade. Toda cidadezinha tem uma. E em todas, uma voz marcante, ‘grossa ou fina’, aquele fulano da rádio.
Me enquadro no grupo dos agudos! Mas, o rádio segue sendo o meu veículo. Driblei as preferências dos graves, dos donos de emissora, claro, para viver um sonho, que no tempo já tem quase 19 anos. E vai se renovando. E ao ligar o rádio, tem o que me faz parar: as vozes.
Vozes são como os cheiros: atraem-nos ou repelem-nos. A minha é característica. Aguda, as vezes estridente. Uma taquara rachada. Tinha um jornal na cidade, que quando tentava me ofender, me nominava de ‘o voz fina’. Eu dava risadas. Afinal, era fina e esganiçada. De certo modo, é identidade. O jornalista, de voz fina, e que gosta de palavras ácidas.
Falo, mas prefiro o silencio. E quem me ouve, nem percebe que sou tímido para falar em público. Esconde a voz, essa fina e estridente. No microfone, dentro de um estúdio, é fantasia. Fala pelos cotovelos, e esganiça. Sou profissional do texto e da voz, e nela as emoções. Choro, fico bravo e dou risadas com seus tons. Em suas nuances.
No início do rádio, não ouvia as gravações; dava um certo pavor. Alguns ouvintes mais brincalhões, acreditavam ser a locutora. E ao telefone, as moças do telemarketing, hora por hora dão um ‘bom dia senhora’. Já nem retruco. Afinal, os cabelos brancos e as rugas no canto dos olhos, me credenciam.
Não a vejo como obscenidade. Parece-me leve, até musical. Um assovio. Não queiram gritando. Sublinha-se as vantagens do meu gosto pelo silencio. Falar comporta riscos; mas eu continuo a preferir a palavra. Meio cantada, as vezes de taquara rachada. Se for assim, poesia. Forte e, de preferência, não editada. E ela se ergue muitas vezes, pra arrumar uma confusão.
A voz, escolhe os sinais de pontuação e já tentaram silencia-a, pela contestação. Incômoda. Inventiva, se revolta, berra e chora. Fala do tempo e da alma, sempre com um tom respeitoso como se falando de si própria, contando a vida de outra pessoa. Alegoria do alegre, da melancolia, e das coceiras existenciais. Mas, ela fala ao microfone, não convidem para um evento público.
Dos embates com políticos, já sobrou pra voz. Irritado um deles usou o discurso pra ataca-la. Trocou o gênero do substantivo na tentativa de tirar a casca da ferida. A voz permaneceu e ele passou. Para alguns, é algo que mete medo. Para barulhenta, já basta a vida em si. Há silêncios de um barulho que não se pode, mas é preciso encontrar. Falo, mas prefiro as horas sem palavras. Só o som do vento, que faz lembrar minha voz.
Sentei na poltrona da recepção da rádio. Fui flagrado ao trocar duas palavras com a secretária. É o Jonas? A mulher falava, falava. Eu ouvia feliz. Consentindo com intercalados, aham. Me senti eleito. Guardei a voz. Pensei em perguntar qual era o som do silêncio, mas decidi guardar pra mim esses pensamentos circulares. Sinto-me é feliz por ter voz, e ter conhecido aquela dona que falava sem parar.
A minha voz não poderia ser inventada; nos seus desafinos, relevos, silêncios, suspiros e soluços. É uma surpresa mesmo quando, tendo de pontuar, vem no ouvido. Encontrar o meu som estranho, é profundo e árduo, mas nunca deixará de ser a minha voz. Mesmo fina e rachada.
E o meu som estranho, é o de milhares, que acompanham pelo rádio. O veículo da voz, do som, segue sendo o meu veículo. 25 de setembro, é só a renovação desse amor.