
A Receita Federal está desenvolvendo uma plataforma tecnológica inédita para viabilizar a cobrança dos novos tributos sobre consumo resultantes da reforma tributária. Segundo o órgão, o sistema será cerca de 150 vezes maior que o Pix em volume de dados processados — um salto impressionante, motivado pela complexidade das informações fiscais a serem tratadas.
A comparação com o Pix serve para dar uma noção da dimensão do novo sistema: enquanto o Pix registra apenas remetente, destinatário e valor de cada transação, a plataforma da Receita terá de processar a nota fiscal eletrônica completa, com dados sobre produtos, emissores, créditos tributários, impostos pagos nas etapas anteriores da cadeia produtiva, identificação de empresas e destinos finais de consumo. Estima-se que cerca de 70 bilhões de documentos eletrônicos por ano trafeguem pelo sistema.
A ideia é tornar o sistema tributário sobre consumo mais automático, transparente e eficiente. Um dos principais mecanismos será o chamado “split payment”, em que o cálculo dos tributos será feito automaticamente no momento da emissão da nota fiscal ou da transação, repassando os valores diretamente para União, estados ou municípios. Além disso, o sistema permitirá o abatimento automático dos tributos pagos anteriormente, evitando a cumulatividade e agilizando a utilização dos créditos tributários. Outro recurso importante será o cashback tributário, por meio do qual parte dos impostos pagos poderá ser devolvida, em tempo real ou próximo disso, para famílias de baixa renda. A plataforma também contará com uma calculadora oficial para empresas verificarem previamente os cálculos tributários, reduzindo riscos de erros e autuações. Com essas funcionalidades, a Receita espera reduzir drasticamente a sonegação e inviabilizar práticas como a emissão de notas fiscais falsas.
O sistema já está em fase de testes com cerca de 500 empresas e deve começar a operar em 2026, inicialmente com uma alíquota simbólica de 1%, sem cobrança efetiva de tributos. A partir de 2027, está prevista a aplicação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que substituirá PIS, Cofins e IPI, e que utilizará integralmente o “split payment”. Entre 2029 e 2032, deve ocorrer a transição dos tributos estaduais e municipais, ICMS e ISS, para o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com redução gradual das alíquotas antigas.
Especialistas projetam que, ao reduzir a burocracia, automatizar o cálculo e recolhimento dos tributos, evitar fraudes e tornar o uso de créditos tributários mais rápido e previsível, o novo sistema pode aumentar a arrecadação em até R$ 500 bilhões por ano — montante próximo ao estimado em perdas anuais com sonegação fiscal no Brasil.
Apesar do potencial, os desafios são grandes. O enorme volume de dados exigirá alto investimento em tecnologia e segurança. A transição para o modelo não cumulativo deve ser calibrada para não penalizar setores de cadeia curta, como o de serviços. Além disso, as empresas terão de se adaptar a uma tributação mais automatizada e transparente, o que pode gerar dificuldades no curto prazo.
A plataforma da Receita Federal, se bem-sucedida, promete transformar radicalmente a forma de arrecadação de impostos sobre consumo no país. Mas, dada a sua complexidade, exigirá uma implementação gradual, testes constantes e ajustes ao longo do caminho para garantir equilíbrio entre eficiência fiscal, justiça tributária e viabilidade operacional.