Após o sucesso das vacinas de RNA mensageiro (RNAm) durante a pandemia de Covid-19, farmacêuticas agora testam essa tecnologia contra vários tipos de câncer, incluindo melanoma, câncer de pulmão e pâncreas. No Brasil, a Fiocruz está retomando estudos para uma vacina contra o câncer de mama.
Especialistas preveem que as primeiras vacinas terapêuticas contra o câncer poderão ser aprovadas ainda nesta década. As empresas que desenvolveram vacinas para Covid-19 já estavam explorando o uso de RNAm para tratar câncer e redirecionaram seus esforços durante a pandemia. Agora, essas pesquisas estão sendo retomadas.
A vacina contra melanoma, um dos tipos mais agressivos de câncer de pele, é a mais avançada e está na última fase de testes clínicos. Desenvolvida pela Moderna em parceria com a MSD, a vacina recebeu o status de ‘terapia inovadora’ pela FDA nos EUA. Dados da fase 2 indicam que a vacina reduziu o risco de morte ou recorrência em 49% e o risco de morte ou metástase em 62%. A Moderna também está nos estágios finais dos testes clínicos para vacinas contra câncer de pulmão e bexiga.
Michelle Brown, vice-presidente da Moderna, destaca que a plataforma de RNAm permite desenvolver vacinas e terapias para uma ampla gama de doenças, incluindo câncer, desde a fundação da empresa em 2010. O objetivo é treinar o sistema imunológico para identificar e atacar células cancerígenas, melhorando os resultados dos pacientes.
Outro laboratório líder no desenvolvimento de vacinas de RNAm é o alemão BioNTech, pioneiro junto com a Moderna nas vacinas contra a Covid-19. BioNTech está desenvolvendo vacinas avançadas contra melanoma, câncer de pulmão, carcinoma de células escamosas de cabeça e pescoço, câncer colorretal e adenocarcinoma ductal pancreático, sendo que, os resultados iniciais para a vacina contra câncer de pâncreas são promissores: três anos após a aplicação, metade dos pacientes ainda apresentava uma resposta imunológica, associada a uma sobrevida mais longa e menor risco de retorno do tumor.
Representantes da Moderna e da BioNTech acreditam que as vacinas contra o câncer podem se tornar realidade até 2030, já Especialistas como o oncogeneticista Bruno Filardi preveem que, com resultados iniciais em três anos, aprovações podem ocorrer por volta de 2026-2027. Ele ressalta que essas vacinas serão mais eficazes para tumores com altas taxas de mutação, mas poderão aumentar significativamente a sobrevida dos pacientes.
João Viola, imunologista e coordenador de Pesquisa do Instituto Nacional de Câncer (Inca), celebra os avanços, mas alerta para a necessidade de tornar essas terapias acessíveis. Muitas novas terapias são caras e restringem-se a populações específicas com maior acesso. Viola enfatiza a importância de uma distribuição equitativa.
As vacinas funcionam ensinando o sistema imunológico a reconhecer o tumor, algo que não ocorre naturalmente porque as células cancerígenas se passam por saudáveis. O RNAm codifica proteínas específicas do tumor, que são então produzidas pelas células do paciente para induzir uma resposta imunológica.
No Brasil, a Fiocruz, escolhida pela OMS para impulsionar a plataforma de RNAm, está focada no desenvolvimento de uma vacina contra o câncer de mama. Patricia Neves, líder do projeto em Bio-Manguinhos, afirma que o foco inicial é no câncer de mama triplo negativo, que é difícil de tratar. A vacina da Fiocruz busca ser uma opção mais universal, ao contrário da abordagem individualizada da Moderna.
A Fiocruz está identificando alvos universais que aparecem em diferentes pacientes com o mesmo tumor. Se esses alvos forem válidos, a vacina poderá ser replicada para outros tipos de câncer, oferecendo um tratamento eficaz e acessível para o SUS.
Esta nova fronteira na oncologia promete um futuro onde o câncer poderá ser combatido de maneira mais eficiente e acessível, salvando inúmeras vidas.